Há uma lenda na Bahia, muito usada em Salvador, de que o baiano é capaz de pagar cem reais para derrubar o seu adversário, mas não paga dez para ele próprio subir na vida. Uma mistura letal de inveja, mesquinhez e arrogância, com uma pitada de estupidez.
Assim agiu recentemente um veículo de comunicação baiano ao afirmar, de forma leviana e irresponsável, que o Pelourinho está dominado por uma facção criminosa e que os comerciantes e moradores estão aterrorizados por conta disto. Isto é mentira. Uma grande mentira, conforme afirmou, de forma indignada, o ator e comerciante da área, Érico Brás.
O Pelourinho, por meio dos seus moradores, comerciantes, entidades culturais, governos federal, estadual e municipal, tem feito um esforço enorme para recolocar a área como principal vetor do turismo na cidade.
Esse ano, dos quase um milhão de turistas que visitaram Salvador, seguramente mais da metade deles passaram pelo Pelourinho, gerando emprego, renda e divulgação positiva da nossa cidade.
A pergunta que não quer calar: qual o objetivo ou interesse de uma matéria com esse conteúdo? Destruir o Pelourinho? Destruir as ações da Prefeitura Municipal e do Governo do Estado? Assustar e afastar os turistas?
Ninguém em sã consciência negará que o Pelourinho tem problemas e que, para superar esses problemas, será necessário a junção de esforços dos entes federativos e do setor privado.
Mas também, não é possível negar que a Polícia Militar e a Guarda Municipal estão presentes, que as Secretarias de Cultura e Turismo municipais e estaduais estão presentes, que a CONDER está presente e que, embora ainda não exista um grau de articulação na dimensão necessária dessas instituições, os esforços nesse sentido são evidentes.
É lamentável que o Centro Histórico de Salvador continue sendo vítima dessa perversidade cultural que permeia a classe média baiana.
Não importa que o Centro Histórico seja Patrimônio Cultural da Humanidade, reconhecido nacional e internacionalmente com um importante conjunto arquitetônico. Não importa que nesse espaço estejam instaladas entidades culturais das mais importantes do Brasil, como a Sociedade Protetora dos Desvalidos, com seus 192 anos de existência e carregando a marca de ser o primeiro programa de previdência do país.
Não importa que, no Pelourinho, estejam presentes o Grupo Cultural Olodum, a entidade cultural negra mais importante do Brasil, nem muito menos os Filhos de Gandhy, o maior e mais famoso afoxé do Brasil. Assim como também não importa que essas entidades e suas manifestações culturais atraiam, para o Pelourinho, milhares de turistas nacionais e estrangeiros, possibilitando assim a geração de emprego e renda para outros tantos milhares de baianos e baianas.
O que importa mesmo, para parcela da sociedade soteropolitana e para parte da mídia em busca de sucesso fácil, é estimular o preconceito e o estigma que o Pelourinho carrega, desde que se transformou em zona de meretrício em meados do século passado.
Isso é uma perversidade cultural. Mais ainda, quando está assentada na pura e simples ignorância.
O Centro Histórico de Salvador precisa ser acolhido pela cidade, tanto pela importância cultural, quanto pela sua dimensão econômica e social. Para tanto, basta que cada um faça sua parte, inclusive a imprensa, noticiando fatos e não factoides.
O Centro Histórico é Patrimônio Cultural da Humanidade e não pode continuar sendo tratado como se fosse um joguete político em época eleitoral.
Toca a zabumba que a terra é nossa!
ZULU ARAÚJO é Gestor Cultural, Arquiteto, Mestre em Cultura e Sociedade e Doutorando em Relações Internacionais/UFBA. Ex-Presidente da Fundação Cultural Palmares/MinC. Publicado originalmente em Portal Umbu. Reprodução total citada a fonte.
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