A mudança brusca no tempo, da onda de calor em boa parte do país para temperaturas em queda e até chuva de granizo no Sul, não se resume a um sobe e desce nos termômetros: ela afeta nosso corpo e pode causar problemas de saúde. Isso porque o ar frio e seco, típico dessa época do ano, favorece a presença de vírus respiratórios e desafia a imunidade, principalmente para quem já tem propensão a problemas alérgicos e respiratórios. O GLOBO ouviu especialistas para entender as principais recomendações para os próximos dias – e que valem para além da frente fria.
— A saúde piora nessas mudanças drásticas de temperatura. Principalmente para quem tem asma, bronquite, rinite, isso desencadeia fenômenos alérgicos. Temos receptores químicos no nariz e no pulmão, e em pessoas que são mais sensíveis o frio é um gatilho de sintomas, causando uma descompensação dessas doenças — explica João Prats, médico infectologista do Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo.
Vírus respiratórios sobrevivem melhor em ambientes secos e frios, e não à toa os casos aparecem mais quando caem as temperaturas. Há ainda um fator comportamental: no frio, as pessoas tendem a se juntar mais em ambientes fechados, de pouca ventilação.
— O grande complicador é o ar seco e frio. Ele causa uma ação irritativa principalmente nos olhos e no trato respiratório, e sobretudo em pessoas já alérgicas, mas pode afetar a todas no geral. Atinge a mucosa do trato respiratório e leva à liberação de uma série de mediadores inflamatórios, o que agrava alergias, como rinite e asma . Pode causar coceira, tosse, desconforto na faringe e na garganta — explica José Elabras Filho, professor da UFRJ e membro do Departamento Científico de Asma da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).
A queda de temperatura também favorece o acúmulo de secreção no nariz e diminui sua eliminação:
— O muco fica espesso, e os cílios do trato respiratório não conseguem eliminá-lo. A redução desse mecanismo de defesa do corpo favorece a ocorrência de infecções respiratórias, tanto virais quanto bacterianas — acrescenta Elabras Filho.
Há, ainda, outro agravante: o ar seco e a redução súbita de temperatura contribuem para o acúmulo de poluentes na atmosfera, afirma o especialista:
— Isso também irrita o trato respiratório e os olhos, e leva a uma maior inflamação respiratória, piorando todas as alergias e causando sintomas mesmo em quem não tem alergia.
O otorrinolaringologista Paulo de Tarso Abrão, professor aposentado da Escola Paulista de Medicina-Unifesp, explica que, além das alergias, o frio também facilita infecções respiratórias.
— O nariz é muito vascularizado, e a função dele é aquecer e umidificar o ar para que chegue aos pulmões. O frio prejudica a atividade mucociliar. Os cílios ficam paralisados e isso dificulta a eliminação de substancias potencialmente agressivas ou particulas de poluição — explica.
Abrão lembra que as crianças de até cinco anos, que estão com o sistema imune ainda em desenvolvimento, e idosos acima de 65 anos, cujo sistema imunológico está enfraquecido, são mais propensos às doenças respiratórias nessa época.
Além da rinite alérgica, comum no inverno, Abrão afirma que têm aumentado casos de rinosinusite, uma infecção das mucosas do nariz e dos seios da face, que exige tratamento com antibióticos. Quando a infecção é viral, 90% dos casos se resolvem com lavagens nasais.
Outro efeito do frio, lembra o médico, é aumentar os casos de hipertensão, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e arritmias cardíacas. A queda de temperatura provoca vasoconstrição, que é uma redução do diâmetro dos vasos sanguíneos.
A prevenção é o melhor caminho, principalmente para alérgicos, que devem estar com o tratamento em dia para não serem pegos de surpresa.
— Quem tem asma, rinite etc, deve seguir o tratamento adequado para essas doenças para evitar que piorem agora. Estar em dia com os medicamentos que desinflamam o trato respiratório geralmente protege contra essas alterações, mas eventualmente pode ser necessário aumentar um pouco a dose. Não pode relaxar no tratamento. E, se surgir alguma infecção, a orientação é tratar prontamente, principalmente as de origem bacteriana, que necessitam o uso de antibióticos — diz Elabras Filho.
Outras medidas também são importantes, dizem os especialistas:
- Manter boa hidratação e a ingestão de líquidos;
Usar umidificadores de ar, principalmente à noite;
Fazer inalação com soro quando a umidade relativa do ar ficar abaixo de 40%;
Se possível, evitar exposição à temperatura externa fria;
Alérgicos e asmáticos são orientados a evitar fazer exercícios expostos ao ar frio; o ideal é apostar por exercícios indoor;
Atenção à higienização das mãos e evitar ambientes fechados com aglomeração;
Segundo o infectologista João Prats, a recomendação sobre a higienização das mãos e a de evitar os ambientes fechados com aglomeração são lições que continuam válidas desde a Covid.
— São medidas que continuam valendo: manter boa higiene das mãos, não visitar outras pessoas se estiver doente. No caso de pessoas imunossuprimidas, também é recomendado usar máscara em locais fechados. E alérgicos devem manter a doença controlada. Na dúvida, o ideal é procurar o médico — completa o especialista, que reforça a importância de manter vacinas de Covid e influenza em dia, além da pneumocócica para os grupos alvo.
Publicado originalmente em O Globo. Reprodução citada a fonte.
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